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REQUISITOS: IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA –PARTE 2/3

 

                   1. Introdução

 

O instituto do bem de família é uma garantia jurídica fundamental para a proteção do núcleo familiar, assegurando-lhe um digno local para residência e convivência. No entanto, a questão da impenhorabilidade do bem de família é um tema complexo que envolve uma série de requisitos legais para a sua aplicação e proteção. Este artigo busca analisar em detalhes os requisitos necessários para que um imóvel seja considerado bem de família e, consequentemente, impenhorável, considerando a legislação atual e suas interpretações jurisprudenciais.

Pode-se considerar dois tipos de bem de família: o residencial e a pequena propriedade rural.

a)      O Imóvel Residencial ou moradia

Bem de Familia Redidencial


b)    A Pequena Propriedade Rural

Pequena Propriedade Rural


2. Requisitos Legais para a Caracterização do Bem de Família

 

Para que um imóvel seja considerado bem de família e, consequentemente impenhorável, é necessário atender a uma série de requisitos estipulados pela legislação. Esses requisitos englobam não apenas a destinação do imóvel, mas também as características específicas que devem ser observadas. Dentre os principais critérios, destaque-se:


a.      a Afetação do imóvel como residência familiar:


Um dos principais requisitos está disposto no artigo 1º da Lei 8.009, de 29 de março de 1990, a saber:

 

Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.

 Parágrafo único. A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as 


Significa dizer que a família deve fazer da residência sua moradia? A resposta é: não necessariamente, mas é evidente que se o local for a própria residência familiar deve ser apontada como tal.

 

No entanto, se a família tem um bem e aloca e vive dos rendimentos desta locação, este imóvel também pode ser alegado como impenhorável. Além disso, o Devedor pode possuir mais de um bem imóvel, e apenas um será designado como bem de família ou impenhorável, sendo o este o de menor valor comercial, ou com registro específico no Cartório de Imóveis, conforme determina o parágrafo único do artigo 5º, da Lei 8.009/1990.

 

Art. 5º Para os efeitos de impenhorabilidade, de que trata esta lei, considera-se residência um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente.

 

Parágrafo único. Na hipótese de o casal, ou entidade familiar, ser possuidor de vários imóveis utilizados como residência, a impenhorabilidade recairá sobre o de menor valor, salvo se outro tiver sido registrado, para esse fim, no Registro de Imóveis e na forma do art. 70 do Código Civil.

 

Deste modo, quando existe ação judicial, cabe ao DEVEDOR provar a impenhorabilidade.

 

Em sua defesa, a depender do caso concreto, pode ser alegado o disposto na Sumula 486 do STJ e/ou Súmula 364 do STJ, destacando que a residência tanto pode ser familiar, bem como, de pessoas solteira, separada e viúva. Vejamos os enunciados:

 

Súmula 486, do STJ

É impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja revertida para a subsistência ou a moradia da sua família. (SÚMULA 486, CORTE ESPECIAL, julgado em 28/06/2012, DJe 01/08/2012).

 

Súmula 364, do STJ

O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas. (SÚMULA 364, CORTE ESPECIAL, julgado em 15/10/2008, DJe 03/11/2008)

 

A Residência Familiar é Impenhorável. 


Para o STJ no julgamento do AREsp 2088444/SP, o Ministro Relator Marco Buzzi, destaca que:

 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. IMPENHORABILIDADE. BEM DE FAMÍLIA. SÓCIO. PROPRIEDADE DE PESSOA JURÍDICA. IMÓVEL ÚNICO. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO. DECISÃO MANTIDA.

 

1. Inafastável o entendimento desta Corte, que reconhece à impenhorabilidade de imóvel de propriedade de pessoa jurídica quando servir de residência para a família do sócio.

 

2. "Não se faz necessário provar que o imóvel em que reside o devedor seja o único de sua propriedade para que se reconheça a impossibilidade de penhora do bem de família, uma vez que essa exigência inexiste no conjunto de normas que disciplina a matéria" (REsp n. 1.762.249/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 4/12/2018, DJe 7/12/2018).

 

3. Agravo interno a que se nega provimento.

 

(AgInt no AREsp 909.458/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 30/05/2019, DJe 04/06/2019)

 

Fique bem atento! Porque na ação judicial, não basta alegar a impenhorabilidade do bem de família, é fundamental no processo provar tal fato. Dentre as provas que podem ser anexadas, pode-se citar, por exemplo, canta de água, conta de energia, IPTU, fatura de TV a cabo, taxa de condomínio, dentre outras, desde que esteja em nome do proprietário e DEVEDOR.

 

Vale ressaltar, que existem exceções, porém este tema será abordado em outro artigo.

 

Outro ponto importante a destacar, é que o STJ tem entendimento que a vaga de garagem com registro próprio pode sim, ser penhorada.

 

Súmula 449, do STJ

A vaga de garagem que possui matrícula própria no registro de imóveis não constitui bem de família para efeito de penhora.


3) Quando o bem é uma pequena propriedade rural, quais os requisitos? 


Pequena propriedade rural usada como meio de subsistência  familiar pode-se opor impenhorablidade


De acordo com o parágrafo 2º, artigo 4º, da Lei 8.0009/1990, tem-se que:

 

Art. 4º Não se beneficiará do disposto nesta lei aquele que, sabendo-se insolvente, adquire de má-fé imóvel mais valioso para transferir a residência familiar, desfazendo-se ou não da moradia antiga.

 

§ 1º Neste caso, poderá o juiz, na respectiva ação do credor, transferir a impenhorabilidade para a moradia familiar anterior, ou anular-lhe a venda, liberando a mais valiosa para execução ou concurso, conforme a hipótese.

 

§ 2º Quando a residência familiar constituir-se em imóvel rural, a impenhorabilidade restringir-se-á à sede de moradia, com os respectivos bens móveis, e, nos casos do art. 5º, inciso XXVI, da Constituição, à área limitada como pequena propriedade rural.

 

É importante frisar que a família deve provar que a pequena propriedade é seu meio de subsistência, ou seja, a pequena propriedade é produtiva, e tais provas devem ser colacionadas dentro dos próprios autos, haja vista um dos principais motivos de recursos desprovidos no STJ é falta de provas nos autos, como se pode perceber nos julgamentos a seguir:


AgInt no AREsp n. 2.304.172/GO – não provido, análise probatória.

 

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PEQUENA PROPRIDADE RURAL. IMPENHORABILIDADE. REQUISITOS. ÔNUS DA PROVA. DEVEDOR/EXECUTADO. PRECEDENTE DA SEGUNDA SEÇÃO. REVISÃO DO ACÓRDÃO. MATÉRIA PROBATÓRIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 7 DO STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.

1. Para o reconhecimento da impenhorabilidade, é ônus do devedor/executado comprovar que o imóvel se enquadra no conceito de pequena propriedade rural e se destina à exploração familiar.

Precedente.

2. A alteração das conclusões do acórdão recorrido quanto ao preenchimento dos requisitos para se reconhecer a usucapião exige reapreciação do acervo fático-probatório da demanda, o que faz incidir o óbice da Súmula nº 7 do STJ.

3. Agravo interno não provido.

(AgInt no AREsp n. 2.304.172/GO, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 18/9/2023, DJe de 20/9/2023.)

 

AgInt no REsp n. 2.071.471/SP – não provimento - ausência de prova

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA. IMPENHORABILIDADE DE PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA, MAS JÁ PREVIAMENTE DISCUTIDA EM OUTRAS OPORTUNIDADES. AINDA ASSIM, EXAMINADA A AUSÊNCIA DE PROVAS DE SUAS ALEGAÇÕES GENÉRICAS. RECORRENTE BUSCA POSTERGAR A DISCUSSÃO. PRECLUSÃO DA MATÉRIA. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. INOVAÇÃO RECURSAL. NÃO CABIMENTO. MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. AFASTADA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.

1. Opera-se a preclusão consumativa quanto à impenhorabilidade da pequena propriedade rural quando houver decisão anterior acerca do tema, mesmo se tratando de matéria de ordem pública.

2. A Corte estadual, ao negar provimento ao recurso do insurgente, reconheceu a preclusão consumativa quanto à alegação de impenhorabilidade da pequena propriedade rural, porquanto já afastada por decisão anterior, e não questionada pela parte no momento oportuno. Decisão em consonância com a orientação desta Corte Superior.

3. A litigância de má-fé, passível de ensejar a aplicação de multa e indenização, configura-se quando houver insistência injustificável da parte na utilização e reiteração indevida de recursos manifestamente protelatórios, o que não se verifica na hipótese.

4. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no REsp n. 2.071.471/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 4/9/2023, DJe de 6/9/2023.)

 

AgInt no AREsp n. 2.130.966/GO – recurso desprovido, análise de provas.

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PENHORA SOBRE IMÓVEL RURAL. DISCUSSÃO SOBRE OS CRITÉRIOS LEGAIS DE DEFINIÇÃO DA PEQUENA PROPRIEDADE RURAL

PARA EFEITO DE IMPENHORABILIDADE. IMPERTINÊNCIA DO DISPOSITIVO LEGAL APONTADO COMO VIOLADO. DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. PRECLUSÃO CONSUMATIVA QUE SE OPERA MESMO EM RELAÇÃO A QUESTÕES DE ORDEM PÚBLICA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 83/STJ. EXCESSO DE EXECUÇÃO EM RAZÃO DE PAGAMENTO PARCIAL DO DÉBITO. REEXAME DE PROVA. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.

1. À luz da Súmula 284/STF, não se conhece de recurso especial na hipótese de o recurso especial apontar violação a artigo de lei que não contém comando normativo apto a ensejar eventual alteração do acórdão recorrido.

1.1 No caso dos autos, os dispositivos de lei tidos como violados, revelam-se inadequados para a solução da controvérsia, pois o Supremo Tribunal Federal, ao definir o alcance da proteção constitucional da impenhorabilidade da pequena propriedade rural (art. 5º, XXVI, da CF/1988), no julgamento do Tema 961/STF, à míngua de lei específica que definisse a pequena propriedade rural, admitiu como parâmetro o tamanho definido no art. 4º, II, a, da Lei 8.629/1993, considerando-se pequena propriedade, o imóvel rural que possua a área compreendida entre 1 (um) a 4 (quatro) módulos fiscais.

2. O entendimento deste Superior Tribunal firmou-se "no sentido de que tão somente o erro material pode ser corrigido a qualquer tempo, enquanto os erros sobre os critérios do cálculo, inclusive, no que concerne a juros moratórios e correção monetária sujeitam-se à preclusão" (AgInt no REsp 1.958.481/RS, Relator Ministro Francisco Falcão, DJe 24/3/2022).

3. Reverter a conclusão do Tribunal local para acolher a pretensão recursal, sobretudo no que se refere à tese de excesso de execução em razão de pagamento parcial do débito, demandaria o revolvimento do acervo fático-probatório dos autos, o que é vedado em virtude da natureza excepcional da via eleita, consoante enunciado da Súmula n. 7 do Superior Tribunal de Justiça.

4. Agravo interno desprovido.

(AgInt no AREsp n. 2.130.966/GO, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 3/5/2023, DJe de 8/5/2023.)

 

Portanto,  colacionar as provas aos autos é fundamental para alegar impenhorabilidade do bem de família, e deve ser feita na primeira oportunidade sob pena de preclusão consumativa.

No próximo tema abordar-se-á sobre meios de defesa e prazo da impenhorabilidade do bem de família.

 

 

Socorro Domingos

Exp. Execução Civil.



 



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